quarta-feira, novembro 09, 2005

7. Deficit de igualdade

Sem esquecer a responsabilidade individual no percurso de vida, há que reconhecer um deficit de igualdade no acesso ao sucesso educativo, realidade comprovada não só pela selecção e reprodução sociais que a escola continua a fazer, mas também pelos números do abandono e do insucesso escolar.
E quem sofre com esse deficit? Os que estão em baixo. Os feios, porcos e maus, como diz Sérgio Niza, fundador do Movimento da Escola Moderna nos anos 60.

Dizem alguns que eles têm insucesso e não são ninguém na vida por sua culpa. É claro que terão alguma responsabilidade no seu insucesso e exclusão, mas será assim tão linear? Eles têm as mesmas oportunidades para aceder ao sucesso escolar? Ou melhor, têm as condições socio-esconómicas e culturais, os estímulos, a mesma auto-confiança e auto-estima, as mesmas expectativas, a mesma motivação e alento, a mesma perseverança, para aceder ao sucesso escolar como as crianças de estratos sociais favorecidos?

Quanta culpa pode ser atribuída a crianças de 6 ou 10 anos pelo seu insucesso escolar? Sabemos que a primeira educação na família é fundamental e estruturante. Mas, que percentagem de culpa atribuir à família desestruturada, sem valores claros, que não dá mais porque não tem mais para dar? Os ciclos da pobreza e da exclusão social tendem a reprodurzir-se de geração para geração se não houver uma intervenção, um acompanhamento.
É mais confortável e fácil colocar toda a culpa nos excluídos em vez de indagar sobre o que nós e a sociedade no geral podem fazer, mesmo que seja pouco. Mesmo sem dar tudo. Porque ajudar não é fazer em vez dos outros o que eles podem fazer por si próprios. É estimular, é encorajar, é criar oportunidades e confiança para as pessoas darem o melhor de si mesmas. Ajudar não é substiuir os outros no seu esforço. É dar estimulo para esse esforço ter lugar e criar o mínimo de oportunidades para o sucesso desse esforço.

Vamos escudar-nos em raciocínios como aquele em que se diz que não temos culpa de os outros serem podres ou infelizes, para justificar a nossa inacção e conformismo perante o insucesso escolar e a miséria humana?

Será que a escola não deve fazer a sua parte, mesmo que seja insuficiente, para termos uma sociedade mais justa e harmoniosa, sem fenómenos de marginalidade que, mais tarde ou cedo, nos vem cair porta? Vejam-se os acontecimentos deste Novembro em Paris...

E tudo o que aqui se diz nada tem a ver com a desresponsabilização das pessoas. Não se procuram álibis para a irresponsabilidade e o pouco empenho. Cada um tem de construir e ser responsável primeiro pelo seu trajecto, pela sua vida. Estamos a falar simplesmente de oportunidades e estímulos para que isso aconteça junto de certas crianças e jovens. Ajudar é fazer pelos outros, mas não fazer tudo em vez deles, ou seja, não substituí-los na parte do esforço que só eles podem fazer.

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