Duas manchetes, dois caminhos. Um irrealista e outro realista, que não dispensa o esforço essencial por parte de quem aprende.
A realidade que sustenta a notícia do Correio da Manhã (20.11.2007), Professores obrigados a dar boas notas, dá conta de mais um sinal da perversidade de algumas políticas educativas. Além do mau sinal (de mais facilitismo) que passa para a sociedade, em particular para as famílias e alunos.
Precisamente quando o discurso político é de rigor, meritocracia, produtividade, trabalho e de investimento nas qualificações... Bonitas qualificações que daqui resultarão, não haja dúvida, a diplomar pessoas sem uma correspondência com as suas reais competências.
As escolas começam a organizar-se para responder à avaliação externa e aos rankings. Os critérios pedagógicos são chutados para canto. O Correio da Manhã dá conta de um atalho, com prejuízos educativos, sobretudo para a qualidade, contraditoriamente, para melhorar os resultados das escolas.
Os conselhos executivos, supostamente, em Portugal continental, estão a pressionar os docentes a dar boas notas, sem corresponder ao desempenho real do aluno e sem medidas que criem as condições e oportunidades para que tal aconteça, evitando-se inflacionar as notas e mascarar a realidade (fingir que o aluno sabe quando não sabe, o que dificultará e desmotivará uma melhoria futura). Tudo para fugir à realidade... Que pavor temos, nós portugueses, da realidade...
Os professores, por sua vez, tentarão organizar-se (será possível?) para responder ao facto de serem avaliados pelos resultados escolares dos alunos e pelo nível de abandono escolar, responsabilizados por factores socio-culturais, que estão além (da exclusiva) responsabilidade do trabalho docente.
É como se o aluno fosse dispensado do trabalho, esforço, predisposição para a aprendizagem e disciplina pessoal. O professor arranjará um jeito de dar a boa nota... Nunca se pensaria que o nível de desresponsabilização daqueles que aprendem atingisse este patamar.
O professor orienta, apoia, cria as condições e oportunidades para que o processo de aprendizagem seja o melhor possível, mas não é o professor que tem de trabalhar em vez de quem aprende.
Hoje, parece que o aluno está a fazer um favor ao professor quando tem de empenhar-se e mostrar trabalho. E quando as notas dos alunos têm peso na avaliação do docente, a situação piora. «Ó professor, veja se me passa sem me dar muito trabalho e sem me exigir disciplina... para ver se sobe de escalão na carreira...»
Estão a destruir a profissão e a escola pública de uma só vez. Não é com falta de qualidade que se valoriza a escola pública.
Todavia, a manchete do Jornal da Madeira (21.11.2007) dá um sinal diferente, em contra corrente. E é preciso estes gestos de racionalidade, de pragmatismo, de realismo e bom senso. Na Escola Básica e Secundária da Calheta, «em termos de produção, a pressão é exercida aos alunos, porque os resultados não dependem exclusivamente dos professores, mas do trabalho e do empenho que os discentes colocam», diz o jornal em consequência de uma conversa com o presidente do conselho executivo daquela escola, António Lucas.
Se a pressão sobre os professores durante as últimas duas décadas, ao nível pedagógico, para melhorar os resultados educativos, acaba por não ter o retorno desejado, é mais do que claro que a solução não está só no trabalho docente. Há toda uma envolvente, várias premissas, que condicionam muito mais do que se pensa o sucesso das aprendizagens em sala de aula.
Como se explica que os alunos dos países de Leste, deslocados e com dificuldades socio-económicas, alcancem elevado sucesso escolar no nosso sistema educativo? Porque trabalham, são disciplinados e as suas famílias, com outra cultura, valorizam a escola. É assim tão difícil perceber que o trabalho e a disciplina são a base do sucesso de qualquer pessoa?
É bom que o paradigma de colocar o peso do desempenho dos alunos (quase) exclusivamente em cima do professor termine, porque está a deixar um rasto de maus resultados escolares no país, hipotecando também o futuro. Seja qual for a motivação, puramente idealista e facilitista ou de mascarar as estatísticas, administrativamente, é tempo de dizer alto que o rei vai nu.
Não basta o professor ser avaliado pelo seu desempenho? Tem de ser avaliado pelo desempenho de terceiros, realidade que não controla nem depende só de si? Ainda por cima retira-se autoridade ao professor para poder exercer pressão para o trabalho e a disciplina por parte do aluno. Desresponsabilize-se e facilite-se a vida ao aluno (o trabalho e a disciplina traumatiza...), que o coitado do professor logo resolverá... nem que fique traumatizado e acabe no divã do psiquiatra, como acontece a muitos.
A recordar:
Educação infantil em Portugal
Estudantes, escolantes e faltantes
Violência e coisas mais camufladas na escola
Sem título 2
Sem título 1
Idealismo e equívocos sobre a assiduidade escolar
Primeira responsabilidade
A mais grave discriminação (ainti-democraticidade)
Condições de trabalho
Nem ditadura por disciplina nem a ditadura da indisciplina
E ainda:
Insucesso escolar vem de longe 3
Insucesso escolar vem de longe 2
Insucesso escolar vem de longe 1
domingo, novembro 25, 2007
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